Historicamente entre as mais poluentes, indústria do cimento faz investimentos e muda procedimentos para poluir menos
23/10/2025
(Foto: Reprodução) Fábricas de cimento brasileiras investem para diminuir a emissão de CO2
No mundo todo, algumas atividades industriais contribuem mais do que outras para o equilíbrio ambiental. Historicamente, a indústria do cimento sempre esteve no segundo grupo: o das mais poluentes. No Brasil, para sair dessa posição desconfortável, os fabricantes têm feito investimentos e mudado procedimentos.
Basta olhar para entender o tamanho do desafio. Cidades são feitas de concreto, e a "cola" do concreto é o cimento, produzido em fábricas como uma em Minas Gerais. Um processo complexo, que a diretora de uma empresa mostra em números e gráficos na sala de controle.
“Por esses painéis aqui, os nossos colegas monitoram de ponta a ponta tudo o que acontece dentro da fábrica. Inclusive, todas as emissões, todas as questões relacionadas às nossas obrigações voltadas para o meio ambiente”, diz Mariana Moura, diretora de pessoas e cultura da Cimento Nacional.
As obrigações ambientais viraram metas do setor, que quer atingir, até 2050, a chamada neutralidade nas emissões de carbono. No Brasil, a indústria do cimento responde hoje por 2,3% das emissões totais produzidas pelo homem - abaixo da média global, que é de 7%.
Boa parte das emissões do setor vem do combustível usado para aquecer os fornos. Um muito comum é o coque de petróleo, que é rico em carbono. O que a indústria tem feito é procurar alternativas para substituí-lo. E o Brasil tem muitas, de diferentes tipos dependendo da região.
Agora, um material fácil de encontrar em qualquer lugar é pneu velho triturado que seria descartado. E realmente: se tem uma coisa que não falta no Brasil é pneu usado, como explica Paulo Camillo Penna, presidente da Associação Brasileira de Cimento Portland – o tipo mais usado no país:
“Hoje, nós utilizamos 75 milhões de pneus. Esses pneus, se enfileirados, são capazes de dar uma volta inteira no eixo da Terra. Isso dá uma dimensão do esforço, do volume e da escala que essa indústria requer para emissão, para redução das emissões de CO₂”.
Indústria do cimento faz investimentos e muda procedimentos para poluir menos
Jornal Nacional/ Reprodução
Lá também se aproveita biomassa, como a moinha de carvão vegetal, e outros resíduos das indústrias siderúrgica e mineradora. O nome dessa estratégia é coprocessamento. A fábrica já substituiu 30% do combustível fóssil – derivado do petróleo – que aquece os fornos e, até 2030, quer chegar a 50%. Para isso, conta até com a ajuda da reciclagem do lixo das casas.
“Quanto mais eu conseguir separar esse material, mais eu vou ter condição de trazer resíduo para os meus fornos e para minha fábrica, e evitar que esse resíduo vá para os aterros”, afirma Mariana Moura.
Dentro do forno, outro desafio. O calcário é queimado junto com outros materiais para produzir clínquer. São pedrinhas de cor cinza que dão resistência ao cimento. E essa queima também libera muito CO₂. Por isso, a indústria tem testado formas de diminuir a quantidade de clínquer no cimento, diluindo a mistura com outros materiais, sem que isso tire a resistência do produto final.
Indústria do cimento faz investimentos e muda procedimentos para poluir menos
Jornal Nacional/ Reprodução
Os testes têm dado resultado. Segundo a Associação Global de Cimento e Concreto, no Brasil, produzir uma tonelada de cimento libera 580 kg de CO₂. A média mundial é de 600 kg.
A indústria também tem feito parcerias com universidades na busca por soluções, como explica um professor de engenharia da USP. Ele diz que novos projetos podem ajudar, sem comprometer a segurança das construções:
“Menos clínquer no cimento, menos cimento no concreto e menos concreto na parede ou na estrutura. Paredes mais finas, estruturas mais leves. Aquela coisa da chapa grossa, pilar grosso é mais resistente, já não é verdade. Quanto menos, mais”, diz Rafael Pileggi, professor do Departamento de Engenharia de Construção Civil da Escola Politécnica da USP.
A diretora técnica do Instituto de Pesquisas Tecnológicas, Luciana Oliveira, concorda: baixar as emissões é uma preocupação que vai da fábrica de cimento à obra pronta:
“O fabricante faz a parte dele e quem compra também tem que fazer a parte dele, quem especifica também. E aí você consegue, nessa cadeia, ir reduzindo os impactos. Então, a gente tem que achar estratégias para melhoria: melhoria dos projetos, melhoria dos produtos e melhoria da utilização desses recursos”.
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