Secretaria de Cidadania do Rio criada este ano aumentou orçamento em 2.700% em 6 meses e tem projetos similares a outras pastas
01/09/2025
(Foto: Reprodução) Secretaria de Cidadania do Rio criada este ano aumentou orçamento em 2.700% em 6 meses
A Secretaria Especial da Cidadania e Família da prefeitura do Rio aumentou o orçamento em 2.700% em seis meses. A pasta foi criada no início deste ano.
O orçamento começou com R$ 2,3 milhões e passou para R$ 62,3 milhões em um semestre. A pasta é comandada por Otoni de Paula Filho, filho do deputado federal e pastor evangélico Otoni de Paula.
Do orçamento, R$ 28 milhões são para um projeto que auxilia a população vulnerável e em situação de rua para emissão de documentos, como certidão de nascimento, carteira de identidade e de trabalho.
Um trabalho essencial para pessoas nessa condição, mas que já é realizado por outra pasta do poder municipal, a secretaria de Assistência Social.
Os quase R$ 30 milhões para este mesmo fim, na secretaria de Otoni de Paula Filho, serão usados para criar três centros de atendimento, os chamados Armazém da Cidadania.
No edital aberto para a escolha das organizações que vão administrar os serviços, foram criadas condições especiais para instituições religiosas e cooperativas.
Uma das cláusulas estabelece que não poderão participar da disputa organizações que já tenham 12 ou mais contratos vigentes com a prefeitura.
Um especialista em Direito Constitucional diz que não é comum esse tipo de limitação.
“Não é comum esse tipo de cláusula limitativa. Na verdade, você quer aumentar o número de competidores”, afirma o professor da FGV Rio, Felipe de Melo Fonte.
O advogado chama a atenção para outro ponto do edital, que prevê que a prefeitura pague em dinheiro vivo pelos serviços, caso a organização não tenha conta bancária.
“Isso enfraquece os controles administrativos que incidem sobre esses tipos de contrato. E nós já tivemos muitos escândalos na administração pública por conta de pagamentos feitos em espécie na boca do caixa”, completa o especialista.
O RJ2 apurou que esse tipo de pagamento é permitido desde 2016, mas pouco usado na administração pública.
Também faz parte do Armazém Digital um serviço que não tem a população em situação de rua como foco, mas as igrejas.
O edital prevê que o projeto regularize imóveis de instituições religiosas, o que ganhou o nome de título sagrado.
As mesmas organizações que vão passar a oferecer emissão de documentos a pessoas vulneráveis vão cuidar também do núcleo de entrega de títulos como um reconhecimento oficial da contribuição social dos templos e organizações religiosas em nossa comunidade, segundo o edital, que trabalham para promover a justiça social, a educação e a saúde.
A Defensoria Pública do Rio de Janeiro acompanha com preocupação a criação de projetos como o mesmo fim em diferentes secretarias.
“Toda iniciativa é boa, o problema é que é uma cidadania recém-criada e uma secretaria chamada de Cidadania e Família onde a atribuição dela é um esvaziamento da Assistência Social”, afirma a subcoordenadora do Núcleo dos Direitos Humanos da Defensoria Pública, Cristiane Xavier.
“E o que acontece no final? Você vai ter várias portas de entrada, onde nenhuma delas dá em uma concretude o que se espera de um serviço público. Então, vamos estar fazendo aqui um gargalo de verba pública onde ela poderia ser muito melhor empregada naquilo que se destina, que é a assistência social”, completa Xavier.
Procurada, a prefeitura do Rio declarou que os armazéns da Cidadania vão atuar apenas na orientação sobre a regularização fundiária dos imóveis das instituições religiosas - o que difere do que está no edital de licitação.
Em relação ao orçamento para atendimento à população em situação de rua pela Secretaria de Assistência Social, a prefeitura informou que a verba será usada integralmente para manutenção de uma unidade de acolhimento.